Durante nove meses, aproximadamente, um pequeno embrião desenvolveu-se. Formou-se um feto, que cresceu até o momento de se “dar à luz”. Durante todo este tempo, o pequenino bebê esteve muito bem protegido, aquecido, preservado de estímulos excessivos. O útero materno é caloroso e envolvente. Para nascer, a criança precisa se esforçar muito, vencer a difícil passagem que a separa do mundo externo. Este é seu primeiro aprendizado, seu primeiro ato de coragem: vir ao mundo!
Deveria ser óbvio para nós, adultos, o fato de que este mundo deve se descortinar aos poucos para a criança, perceber que quem esteve por tanto tempo totalmente protegido precisa aprender, lentamente, a conviver com os novos estímulos sensoriais (luzes, sons, sabores). Infelizmente, tal percepção já não é mais tão lógica. Observamos, por exemplo,como é grande a quantidade de bebês, muitas vezes com menos de um mês, que podem ser vistos, atualmente, em shopping centers, supermercados (até de madrugada!), festas e outros locais excessivamente agitados para quem acabou de nascer. Podemos nos
questionar sobre que influência causa na criança esta hiper estimulação tão precoce. Quem sabe possamos comparar o que isto significa para a criança com como nos sentimos se, após uma agradável noite de sono, somos despertados pelo suave canto dos pássaros e uma doce mão que nos afaga a cabeça ou por um despertador estridente e alguém nos sacudindo. Certamente começa aí o problema atual e crescente de crianças diagnosticadas como “hiperativas”.
Hoje em dia, até o momento de ir para a escola se antecipou, o “descortinar” do mundo chega cada vez mais cedo. Antigamente a idade escolar iniciava aos sete anos. Até então, era normal que as crianças ficassem em casa, cuidados por seus familiares. E, durante esse primeiro setênio (período de sete anos), ela podia aprender naturalmente suas mais importantes lições: andar, falar, pensar e se relacionar socialmente. Tudo através do exemplo, da imitação do adulto próximo a ela e, é claro, do aprendizado oriundo de suas próprias brincadeiras. Mas, em nossa sociedade atual, cada vez mais as famílias se vêem
obrigadas a colocar as crianças em creches e jardins desde muito cedo, a fim de poderem desenvolver suas atividades profissionais.
Diante deste quatro, talvez difícil de mudar, resta a possibilidade de, ao se buscar uma escola, primar por um local que procure conservar o ambiente caloroso do lar. Onde haja adultos conscientes das reais necessidades da criança, do papel que desempenham na educação infantil e, principalmente, dignos de serem por ela imitados. Um local onde a criança possa brincar saudavelmente, ao ar livre, com brinquedos que possibilitem a ela o desenvolvimento pleno de seus sentidos, de suas emoções e de seu organismo.
Além do mais, um ambiente acolhedor na infância traz lembranças que ficam para toda a vida. Quem é cuidado aprende a cuidar! Quem não sorri ao lembrar-se de momentos onde podíamos nos sentar no colo da avó e ouvir histórias, ou raspar com o dedo a tigela de um bolo recém-preparado pela mãe? Talvez muitos pais, hoje em dia, não possam ter tido o prazer, quando crianças, de entrar em uma cozinha constantemente perfumada pelo cheiro do pão que acabou de ser assado. É esse tipo de vivências simples e calorosas, nos primeiros anos de vida, que educa adequadamente a vontade (força interior que nos move para a ação no mundo) e a índole da criança. Se apoiarmos essa força de vontade, dando
espaço para a criança brincar sadiamente, quando ela se tornar adulta também terá vontade de agir, de transformar o mundo. E é principalmente antes dos sete anos de idade que podemos fortalecer a vontade de agir.
Na educação infantil (maternal e jardim), a pedagogia Waldorf procura recriar este ambiente caloroso do lar. Todo o período em que a criança está na escola é cuidadosamente preparado. Todas as vivências são feitas dentro de um ritmo orgânico (contração e expansão, inspiração e expiração). Expansão, por exemplo, no momento em que as crianças brincam livremente dentro das salas, depois a contração, quanto todos se unem para participar da roda rítmica e do lanche (alimento do corpo). Novamente a expansão, com o brincar na área externa da escola e a contração, quando todos são reunidos para ouvir uma história (alimento da alma). O ritmo que se repete diariamente é essencial para trazer segurança à criança e desenvolver nela hábitos saudáveis. É claro que este ritmo também se transforma como na natureza, a cada mudança de estação, e como no íntimo da alma humana, na vivência das diferentes celebrações (Páscoa, São João, Micael e Natal).
Para seu desenvolvimento motor e de equilíbrio, as crianças são incentivadas a pular corda, andar de perna-de-pau, pular amarelinha, pular elástico, brincar na caixa de areia. Estas brincadeiras promovem, anos mais tarde, o fortalecimento cognitivo no jovem e no adulto. Isto porque o desenvolvimento motor está diretamente relacionado ao desenvolvimento cognitivo. Os brinquedos utilizados nas escolas Waldorf são, geralmente, produtos da natureza, que cresceram e se transformaram naturalmente: um galho de árvore, uma conchinha, etc. A criança que brinca com esses elementos sente-se fortalecida
interiormente, pois os processos de desenvolvimento e crescimento intrínsecos a eles correspondem também ao que está ocorrendo no interior da própria criança. Além disso, sua fantasia e criatividade são ativadas por essas formas. No mais, os brinquedos simples e naturais (feitos com madeira, lã pura, algodão, seda, pedras, etc.) estimulam o tato e são muito mais agradáveis ao toque. Faça esta experiência: coloque em um saco fechado e opaco brinquedos de plástico e eletrônicos e, em outro saco, brinquedos de madeira, bonecas de pano, lã. Peça, depois, para que uma pessoa que não conhece o conteúdo dos mesmos coloque sua mão no interior de cada um e relate suas sensações ao tocar os objetos
dos diferentes sacos. Experimente você também! E então… Que tipo de estímulo parece mais adequado para a criança?
A escola Waldorf não alfabetiza as crianças no jardim da infância, pois exigir da criança um aprendizado intelectual nesta etapa de crescimento retira suas forças vitais, enfraquecendo, inclusive, seu desenvolvimento físico e a formação de seus órgãos. Já o desenho, a pintura e a música estão presentes diariamente nas atividades desenvolvidas com as crianças, assim como ajudar a professora a preparar a massa do pão (que será compartilhado por todos na hora do lanche) e a organizar a sala depois das brincadeiras – é importante que as crianças guardem os elementos separados em cestinhas ou caixinhas, isto cria nelas um sentido de ordem e forma, preparando para o pensar lógico. Elas não sabem fazê-lo sozinhas e precisam do exemplo adulto de que a arrumação é feita com gosto. Se fizermos com vontade e alegria, as crianças também irão fazê-lo.
Este tempo em que a criança cresceu fortalecida pela possibilidade de brincar e imitar dá a ela uma prontidão para a educação formal. Agora sim, gradativamente ela adquire condições de permanecer mais tempo concentrada, pois suas forças vitais tornam-se disponíveis para atuar na memória, sem ônus para seu desenvolvimento físico. Distingue-se nas crianças que saem dos jardins da infância Waldorf para iniciar a vida escolar (1º ano), muito entusiasmo e vontade de aprender, além das bochechas sempre rosadas.